Metodologia
“Se nada ficar destas páginas, algo, pelo menos, esperamos que permaneça: nossa confiança no povo. Nossa fé nos homens e na criação de um mundo em que seja menos difícil amar.” (Paulo Freire em Pedagogia do Oprimido)
Coletivo da Cidade, lugar de encontro, onde, por meio da iluminação vinda de educadores populares como Paulo Freire, tentamos construir uma prática que se reconstrói no cotidiano, em diálogo com as pessoas envolvidas, crianças, adolescentes, famílias, educadorxs, comunidade do entorno.
Além de Freire, a inspiração vem também do educador português contemporâneo, José Pacheco, cujo pensamento contribuiu para pensarmos as “Rodas de Aprendizagem” que são espaços de saberes construídos coletivamente; e cada roda contempla uma perspectiva diferente do processo de aprendizagem, resultando na formação integral para as crianças e adolescentes participantes do processo, pois nas rodas as crianças e adolescentes são estimuladas a: construir e resgatar identidade pessoal e coletiva, conviver, aprender juntas, criar, cuidar umas das outras e participar ativamente da vida comunitária na cidade.
A EDUCAÇÃO POPULAR é a teoria do conhecimento referenciada na realidade, com metodologias incentivadoras à participação e ao empoderamento para a cidadania ativa, além de ter base humanista e libertária, almejando a redução das desigualdades e o aprofundamento da democracia com participação popular. O colombiano Mejía afirma que a educação popular é proposta político-pedagógica que busca construir conhecimentos que possam conteúdos políticos transformadores da realidade no campo popular.
MEJÍA JIMÉNEZ, Marco Raúl. Sindicato e pedagogia: Rumo a uma escola enraizada na educação popular. Trad.: Beno Fernandez, Ijuí: Unijuí, 1989 (coleção educação; 9)
O Observatório da Criança e do Adolescente (OCA) foi pensado como forma de elevar as vozes coletivas para se tornarem vozes da comunidade para dentro e para fora do território, mostrando o que as pessoas que ali residem pensam e querem para a cidade onde vivem, como forma de participação ativa trazida pelas rodas de aprendizagem. O conteúdo trabalhado está no âmbito dos direitos humanos entendidos de forma ampliada.
Buscamos, com a metodologia das rodas, aliada as ferramentas do OCA, atender aos princípios da educação de qualidade relacionando os processos com a vida e considerando a participação direta dxs envolvidxs com “microfone” sempre aberto.
E para que? Para amplificar posturas críticas, capacidade de analisar, comparar e refletir. Fortalecer relacionamentos interpessoais e criar vínculos afetivos, exercitar a participação democrática, desenvolver as sensibilidades estéticas na perspectiva da valorização do outro em suas diferenças estimulando o espírito de liberdade, a alegria de viver e o desenvolvimento integral de suas potencialidades humanas.
O processo se inicia por meio da realização das Assembleias do Coletivo, nas quais as crianças e adolescentes escolhem os temas a serem trabalhados ao longo de cada mês. A partir das escolhas, os temas são desenvolvidos em diferentes linguagens nas Rodas de Aprendizagem, conforme descrição abaixo:
DIREITOS HUMANOS são um conjunto de valores que cada pessoa possui para que possa viver com dignidade. Os direitos são universais, interdependentes e inegociáveis. Viver com dignidade significa ter acesso à alimentação, à moradia, à saúde, à educação, à liberdade, ao lazer, ao trabalho, etc. Significa viver uma vida sem violência, discriminação e privações.
Alguns direitos elencados no Pidesc (Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966)): Autodeterminação e ambiente sadio, não discriminação; Igualdade entre homens e mulheres; trabalho, associação em sindicatos, greve, lazer; Previdência social; Proteção à família, à maternidade, às crianças e aos/às adolescentes; Alimentação e moradia; Saúde; Educação; Cultura.
Rodas de Aprendizagem
Roda do Saber
A primeira roda é a do saber, quando crianças e adolescentes participam de formação orientada pela educação em direitos humanos, por meio de várias ferramentas tais como jogos, livros, contação de histórias etc. As construções são sempre dialógicas, favorecendo a participação dxs envolvidxs.
Neste momento os temas trazidos pela assembleia são trabalhados na perspectiva dos direitos, em uma construção que avança a cada etapa. E ao final crianças e adolescentes demonstram o conhecimento adquirido compartilhando com o grupo por meio de várias linguagens, textos, histórias orais, teatros, desenhos.
Roda do Criar
Nessa segunda roda as crianças e adolescentes são estimuladas a trabalhar com os temas escolhidos de maneira lúdica e artística, utilizando para tanto a linguagem da música, da fotografia e vídeo, da comunicação popular, das artes cênicas, das artes plásticas, da dança e das brincadeiras e jogos populares.
Nesta roda, a principal ferramenta do OCA tem participação relevante, a saber, a educomunicação, que traz elementos como oficinas de fotografia, vídeo, textos. Foi no âmbito da educom que nasceu a agência voz da quebrada (link).
As atividades acontecem semanalmente, sempre às terças-feiras e abordam a cada encontro uma linguagem artística diferente que estimule o potencial criativo das crianças e adolescentes a partir do tema gerador. Ao final dos encontros, as crianças e adolescentes geralmente produzem diversos materiais criativos, como por exemplo: pequenas peças teatrais, paródias, músicas, colagens, esculturas, entre outras; abordando o tema por meio do estímulo da expressão da linguagem brincante e artística.
Essa roda favorece o resgate da autoestima, fortalecimento das identidades e a sensibilidade para a percepção do outro em suas diferenças e na diversidade de suas expressões artísticas, culturais, étnicas, religiosas, físicas e de orientação sexual.
Roda do Cuidar
Na terceira roda de aprendizagem, as atividades desenvolvidas abordam o autocuidado, o cuidado com o outro, a cooperação e a cultura da transformação do espaço. A partir de atividades utilizando a metodologia do teatro do oprimido, jogos cooperativos, dinâmicas de cuidado e percepção do corpo, artesanato, reaproveitamento e reutilização de materiais; busca uma nova relação crianças e adolescentes com o território, construindo um novo modelo de relação entre elas mesmas e sua comunidade, promovendo a socialização e o desenvolvimento emocional e corporal.
As oficinas da Roda do Cuidar acontecem semanalmente, sempre às quartas-feiras e a cada encontro dialogam com o tema escolhido proporcionando uma atividade diferente dentre as apresentadas, por meio da qual o tema possa ser internalizado e vivenciado pelas crianças e adolescentes.
Roda do Conviver
A roda do conviver proporciona interação com a comunidade, por meio da intervenção na realidade de forma criativa, estimulando o protagonismo de crianças e adolescentes. Este momento é importante por proporcionar que as vozes do Coletivo se misturem com as vozes da comunidade, ou seja, é a hora e a vez do OCA se colocar em marcha para partilha de vivencias.
As atividades que compõem essa Roda são desenvolvidas por meio de consultas e entrevistas na comunidade, marchas de conscientização sobre direitos humanos e direitos de crianças e adolescentes, cortejos, exposições de arte experimental e itinerantes, saraus comunitários, entre outras intervenções que propiciam o direito ao exercício da cidadania e o amadurecimento do que significa o território, a reflexão sobre o que é um território educador e principalmente, o que significa direito à cidade. Mais uma vez as ferramentas da educomunicação utilizadas pelo OCA são importantes para que as vozes se misturem.
Roda de Brincar
Finalizando o ciclo das Rodas de Aprendizagem, a quinta e última é a Roda do Brincar, onde as crianças e adolescentes são estimuladas a dedicarem seu tempo livre ao lazer e a recreação sem maiores conduções objetivas de adultos.
Essa Roda de Aprendizagem acontece perpassando todas as outras, diariamente, e as crianças e adolescentes tem o tempo livre dedicado exclusivamente a brincar livremente, sem obrigações ou metas pré-estabelecidas. Esse é um momento de desfrutar a infância, a socialização, a relação com o corpo, com o outro e direcionar a energia criativa para a brincadeira, estimulando assim o desenvolvimento de uma infância de qualidade.
As atividades que acontecem nessa roda, são escolhidas e conduzidas pelas próprias crianças e adolescentes (Por exemplo: campeonatos de futebol, mini gincanas, queimada, brincadeiras tradicionais da cultura da cidade, etc…) Elas vivenciam os frutos dessa experiência juntas.